Friday, February 9, 2007

ABORTO: A SOLUÇÃO QUE NÃO SE DISCUTE

"Para se ser livre, o primeiro mandamento é viver"

henri louis bergson
(1869 - 1941)

Extensos rios de tinta e de saliva escorrerram ao longo das últimas décadas acerca de um problema controverso que parece carecer de uma solução pacífica à vista: o Aborto. Mesmo despois do "Não" à despenalização da interrupção voluntária da gravidez (um nome "pomposo" para esconder das "mentes mais sensíveis" o verdadeiro nome do problema) ter vencido com uma margem significativa o "sim" na referendo, obrigando as portuguesas e os portugueses a irem a votos neste domingo, dia 11 de Fervereiro, pronunciando-se mais uma vez sobre este assunto tão polémico e complexo.

Na altura em que eu estava na Universidade e surgiu o debate à volta da questão do Aborto, aquando do primeiro referendo realizado em Portugal sobre esta matéria (e, por acaso, a primeira experiência realizada sobre este instituto jurídico, instituicionalizado pela revisão da Constituição da (III) República Portuguesa de 1997), muitas foram as discussões e afirmações que ouvi de cada um dos meus colegas, apoiantes opostos de cada uma das facções, mas houve já nessa altura algumas questões que ficarão a meu ver em aberto, e é sobre elas que eu gostaria de refletir neste momento.

Quando começa a vida? Que há vida desde a concepção, no sentido em que todas as céluluas são formas de vida é um facto que não merece contestação a nenhum médico ou biólogo. Nas primeiras 24 horas após a fecundidade, nasce o zigoto, uma nova identidade genética que. se tiver condi9ções para se desenvolver, dará origem a um novo indivíduo.

Ora, sendo certo que, no momento da fecundação, surge um ser humano em potência, deverá ser-lhe conferido o mesmo o mesmo estatuto de protecção ética e jurídica que a um ser humano de facto?

É certo que o entendimento dominante do Direito em Portugal, como no resto do mundo ocidental, que não penaliza o Aborto e o homicídio da mesma maneira deriva da ideia de evolução gradual da actualização da vida embrionária, algo defendido pelo filósofo Paul Ricoeur em 1990, sugerindo que, para definir vida humana, se acrescentassem ao critério biológico os conceitos de limiar e desenvolvimento, ou seja, o respeito pela vida embrionária deverá ter graus de actualização. É por isso que, quando uma mulher tem um aborto espontâneo ou médico, não é dado ao feto o mesmo tratamento que a criança, não havendo lugar a funeral, excepto nas fases mais avançadas da gravidez.

É essa ideia de "Estatuto Progressivo" que faz com que a lei trate o embrião como um objecto, nomeadamente na investigação científica, e, por outro lado, que outros valores sociais, como o direito da mulher à autodeterminação reprodutiva se sobreponham ao direito à vida do embrião, que não é absoluto.

Outra corrente dominante da biologia do desenvolvimento defende que o factor diferenciador do homem em relaçãoaos outros seres é o seu cérebro. É ele que confere-nos a razão, a consciência e a capacidade de pensar e de criar, de nos relacionarmos com os outros e de sentirmos emoções. Ora, se, em termos jurídico-penais, o termo da vida humana verifica-se com a cessação definitiva das funções do cérebro, ou dito de outra maneira, da falência das funções neocorticiais, e os primeiros neurónios formam-se por volta do 30.º dia, entre as oito e as dez semanas, estabelecendo-se alguns circuitos motores que originam reacções do tipo reflexo, sendo certo que só se pode falar em funcionabilidade do cérebro, só a partir das vinte e quatro semanas, será que poderemos falar em vida humana, se estivermos perante um feto com apenas dez semanas?

À parte dos problemas éticos e sociais, para não falar dos económicos, sobretudo quando falamos dos negócios paralelos que centenas de clínicas e casas particulares fazem à custa do Aborto Cladestino (que, na minha opinião, vai sempre existir, que o "sim" ou o "não" vençam no próximo dia 11 de Fevereiro), existiu sempre uma questão que ainda ninguém discutiu a sério: A pena aplicada ao crime de Aborto.

Uma vez que os defensores do "Sim" consideram que a despenalização é injusta e degradante pelo facto de mulheres que praticam abortos serem levadas á barra do tribunal, mesmo que pessoalmente não concordem com a prática do Aborto, e os defensores do "Não" utilizarem como argumento de justificação à sua oposição à despenalização da interrupção voluntária da Gravidez, o "Sacrosanto" Direito à Vida, apesar de entendenrem que não gostariam de ver mulheres na cadeia pela prática do crime de Aborto, entendendo que a pena do crime em causa é inadequada para este caso ENTÃO MUDE-SE A PENA!

Em vez de defenderem uma despenalização de um acto que, torno a repetir, não resolve o problema do Aborto Clandestino, uma vez que o próprio Ministro da Saúde, Correia de Campos, garantiu que o SNS não vai comparticipar os custos dos Abortos Legais em estabelecimentos de Saúde Públicos nem vai garantir o sigilo de identidade das mulheres que praticarem Abortos, obrigando essas mesmas a recorrer a Clínicas privadas nacionais ou estrangeiras e, para as mulheres que não têm grandes rendimentos, Casas particulares disfarçadas de Clínicas Clandestinas, aonde são praticados Abortos sem o mínimo de condições de Higiene e de Segurança, levando a uma ameaça de crescimento de uma cultura de desresponsabilização por parte da mulher com a concepção da vida humana e com o respeito pela integridade da evolução de um candidato a ser vivo que não pediu para nascer mas duvido que, alguma vez, pedisse a sua morte, ou, no caso dos defensores do "Não" defenderem um princípio, que não é absoluto para todos os casos, e manterem uma aparente preocupação e hipocrisia para com as mulheres que são julgadas pelo crime de Aborto, achando que a pena de prisão não é a forma mais adequada de sancionar e precaver este acto, então era unirem ambos os movimentos os esforços para uma efectiva campanha de mudança da pena de prisão, actualmente existente para o crime de Aborto, para uma pena Comunitária, como há uns tempos atrás foi defendido pelo Dr. Bagão Félix e pelo Prof. Dr. Freitas do Amaral.

Em vez de punir uma mulher pela prática do crime de Aborto de acordo com os limites e condições da lei de 1984, ou seja, com uma pena de prisão até aos três anos, punam essa mulher com uma pena exemplar: Em vez de Prisão, uma mulher que aborte passa a fazer um trabalho comunitário exemplar, servindo de auxiliar de parteiras em maternidades portuguesas. É uma medida pedagógica e exemplar que não humilha a mulher e obriga-a a refletir e a ganhar maior responsabilidade sobre o acto que praticou.

O Profeta Lusitano

P.S: Já agora, se por razões económicas e socias uma mulher deve Abortar, o que dizer de uma mulher que Aborta, só porque descobriu que o sexo do seu bébé não lhe agradava, ou Aborta porque lhe apetece, apesar da aprovação do pai biológico (ou sociológico) em cuidar dessa criança quando nascer, ou Aborta para vender a placenta aonde estava o seu futuro rebento para clínicas que fazem negócios ilegais com empresas de cosmética...acham que o direito dela também é absoluto?

Fica ao vosso critério.

1 comment:

Unknown said...

Já repararam que o comentário sobre o aborto foi parar ao buraco errado. Serão coisas da idade? Andropausas? Se quiserem ter a gentileza de ler esse comentário no primeiro post e comentar ficarei muito feliz e se estimular a contradição ainda mais feliz ficarei. Eternamente grato e perdoem a falta de pontaria...